No MDOC, Christian Als explica como “o amor elimina a raiva”

Será possível acreditar na existência de nazis na Ásia? Os cineastas dinamarqueses Kristoffer Poulsen e Christian Als no documentário Daughter of Genghis abrem uma porta para o mundo de nacionalistas mongóis. A personagem principal é Gerel, uma mãe solteira que luta pela pureza da raça mongol e contra a exploração estrangeira. É uma viagem de sete anos ao longo de qual Gerel encontra a sua salvação. O filme foi apresentado no festival MDOC, em Melgaço, por um dos realizadores Christian Als. Tivemos oportunidade de trocar algumas palavras com Christian Als.

Sobre a escolha do tema
Foi num artigo no jornal The Guardian que descobrirmos a existência de grupos nazis na Mongólia. Ali mencionava-se que existiam grupos com mulheres entre os seus membros. Decidimos ir lá e filmar.  Falámos antes com homens, mas eles não foram muito interessantes. Eram brutos, violentos, muitas vezes ligados a criminosos. Pois quando perguntávamos a razão do ódio contra os chineses, os nazis nem se quer conseguiam responder. Tudo isso nos parecia muito artificial. Por isso, decidimos não continuar.

Sobre o encontro com a personagem
Foi no último encontro que decidimos perguntar pelas mulheres. E percebemos que uma tinha saído do grupo e criado um para mulheres. Foi nesse momento que decidimos pedir o contacto dela. Ainda me lembro do momento em que ela entrou no restaurante onde marcamos o nosso encontro. Logo se percebeu que o filme estava aí. Ela era muito diferente de todos os outros: muito inteligente, uma pessoa formada na área de artes. No entanto, o mais importante foi o seu ponto de vista sobre o nacionalismo; era muito mais interessante e complexo. Ela foi aquela personagem que tinha todas as capacidades para carregar o filme.

Sobre a comunicação
Foi um pesadelo! Ela não falava inglês. E nós, claro, não falamos mongol. Trabalhámos sempre com tradutores, antropólogos e pessoas que estudam os movimentos nazis. Uma delas é casada com um mongol e fala a língua. Ajudou-nos imenso, não só na tradução, mas também nas informações sobre os grupos de nazis na Mongólia. A outra questão da língua foram as traduções do material. Nós tínhamos mais de 10,000 horas de gravações que precisávamos sempre de traduzir.

Sobre a transformação da história e de Gerel
No início, queríamos apenas perceber a natureza do ódio e da raiva; perceber porque o movimento nacionalista era cada vez mais forte. Ao longo de sete anos fomos à Mongólia mais de dez vezes. Durante esse período, a Gerel acreditava cada vez mais em nós e abria-nos cada vez mais o seu mundo. No início sabíamos que ela tinha um filho de seis anos, mas não pensámos em fazer uma história pessoal. Na sua luta e no seu ódio abandonava o filho, que foi muito doloroso para nós, pois todos temos os nossos filhos e não percebemos como é possível não tratar deles. Mas para ela foi difícil ser mãe. Ela não sabia o que fazer. Só que com tempo o seu filho começou a crescer e a fazer perguntas, começou a ser uma parte muito importante da história. Da sua transformação. Foi assim que a nossa narrativa mudou. E decidimos mostrar como qualquer mudança é possível. Ficou então uma história de transição do ódio para o amor. De como o amor elimina a raiva.

(Ariuna Bogdan, em Melgaço)

Leave a Comment

Your email address will not be published. Required fields are marked *

Scroll to Top